sábado, maio 2

NOTAS SOLTAS

Homenagem a Rui Costa

1. Excelentíssimo Dr. Ricardo Costa, V. Exª desiludiu-me e desiludiu muitos dos aficionados deste futebol de podridão em que a esmagadora maioria dos seus agentes e dirigentes não tem carácter nem um pingo de vergonha das asneiras que fazem.
Tinha-o por uma pessoa exemplar, isenta, sensata, com a dose de bom-senso que deve presidir a um julgador de actos e comportamentos humanos. Aliás, foi o que sempre me ensinaram na Faculdade da vetusta Universidade onde V. Exª, dizem, é Professor. Outros tempos bem longínquos de que obviamente se não lembra!

V. Exª não é juiz e isso, nos tempos que correm, era logo, infelizmente, uma faceta a seu favor. Professor versado em direito desportivo, foi capaz de interpretar o direito disciplinar que lhe cabe aplicar como um ramo do Direito autónomo do Direito Penal. Assumiu-se como Presidente de uma Comissão Disciplinar que ousou desafiar a estrumeira do sistema da corrupção desportiva com larga implantação, benefício e devoção.

Desatinou V. Exª, a partir de então. Julgou necessário justificar o que bem justificado estava, num laivo de protagonismo que diria insensato quão ao julgador é sublime o recato. Deu azo a resposta aziaga e acre da corja imensa dos tarefeiros do sistema batoteiro que houvera condenado, ávidos de um pretexto para o crucificar em hasta pública. E os que louvavam sua coragem e rectidão hesitaram perplexos, questionando-se sobre a firmeza, coragem e convicção, vendo até no desatino um resquício de contrição.





2. O que o “Público” relata, citando a “Lusa”, desfez em cacos o último resquício da ilusão. Alegadamente aí se diz, citando V. Exª, Dr. Ricardo Costa, que a Comissão Disciplinar não instaurou um "sumaríssimo" a Paulo Bento … «porque o árbitro “observou” a reacção do treinador do Sporting e a omitiu no relatório» …
E acrescenta V. Exª:

«Naquele caso podia-se colocar a hipótese de dizermos que é uma conduta extraordinariamente grave e partir para um sumaríssimo» …

Com o devido respeito, discordo de V. Exª. É certo que o tão apregoado “sumaríssimo” exige como requisito que o árbitro não tenha “observado” a conduta a sancionar: E como dizem que V. Exª disse, ele “observou” a reacção de Paulo Bento.
Mas a lei que V. Ex cita exige mais, exige ainda que o árbitro não tenha “avaliado” essa aludida conduta.
O artigo 172º, nº 5, in fine, do Regulamento Disciplinar da LPFP exige claramente – assim aprendi na excelsa Escola, (pelo menos naqueles tempos), em que V. Exª lecciona – a verificação simultânea dos dois requisitos, não basta apenas um. Ou seja, é necessário “que se demonstre que a equipa de arbitragem não tenha”:

“observado” e “avaliado”

É o que significa a “copulativa “ e, muito diferente da “alternativa” ou.

Por conseguinte, e com todo o respeito, não basta não ter observado a conduta a punir! É também exigido que, simultaneamente, não tenha avaliado a mesma conduta.

E quem disse a V. Exª que o árbitro “avaliou” a conduta de Paulo Bento? É certo que, ainda alegadamente, diz o seguinte:

… «vamos ver a imagem e vemos que ele (árbitro) está a “avaliar" a reacção de Paulo Bento após a expulsão» …

Pergunto de novo. Como pode V. Exª saber que o árbitro “avaliou” a reacção de Bento?! Foi a imagem que lho segredou?! Foi por telepatia?! Foi porque resolveu presumir indevidamente esse facto importantíssimo?!





3. O mais grave de tudo e que desprestigia a sua Comissão Disciplinar, retirando-lhe toda a credibilidade e isenção, são estes factos ao sabor das ondas e das conveniências. Diz V. Exª que Paulo Bento não foi alvo de “sumaríssimo” e consequente castigo porque …

«o árbitro observou a reacção».

Porém, na final da Taça da Liga, Paulo Bento fez um gesto que toda a gente interpretou – se quiser, Dr. Ricardo Costa, tal como o senhor diz, toda a gente “avaliou” – como querendo significar que o árbitro estava a roubar o Sporting. E não foi castigado por esse gesto! ...
Sabe qual a justificação que foi dada?

«o árbitro não observou a reacção»

Então, qual é o critério? Se observa, não se pode punir! Se não observa … não se pode punir!
Assim, Paulo Bento tem toda a razão! A ele ninguém o cala! Claro que não! …

Mas há mais, Dr. Ricardo Costa! A forma de processo "sumaríssimo" aplica-se apenas aos casos do tal nº 5 do artigo 172º do Regulamento Disciplinar …

… «desde que a sanção a aplicar não determine a suspensão da actividade por período superior a um mês» …

A conduta de Paulo Bento, que a imagem televisiva mostra a todo o mundo, é, como dizem que disse V. Exª, extraordinariamente grave. Por conseguinte, não se lhe aplica “sumaríssimo”. Aliás, nem sequer processo sumário mas a forma de processo disciplinar, uma vez que é esta forma de processo a que se aplica às “infracções disciplinares qualificadas como muito graves e graves e, em qualquer caso, quando a sanção correspondente determine a suspensão de actividade por período superior a um mês”.

Sabe V.Exª, Dr. Ricardo Costa qual o único requisito que a "jurisprudência" prática da sua CD consagrou, quase como um antigo “Assento” do STJ – felizmente considerado inconstitucional – para que ela instaure um “sumaríssimo”?
Não são coisíssima nenhuma os requisitos que enumerou!
O único requisito exigível é que o pretenso infractor seja alguém do Benfica!
Ao Benfica não se presumem avaliações por omissão ou por telepatia de imagem televisiva, de modo a favorecer eventuais prevaricadores! Quem é do Benfica tem o azar de os árbitros se esquecerem e não “observarem e avaliarem” as condutas! Deixam assim, o caminho livre para a Comissão Disciplinar presidida por V.Exª.

Ingénuo, talvez por V.Exª conseguir ser Professor na Faculdade daquela Universidade que eu guardei na minha Pasta com tanta Saudade, ainda pensei que toda a culpa estava nos árbitros, delegados, observadores e outros mandaretes do sistema, em troca da fruta e outras benesses.
Nos árbitros, delegados, observadores e toda a catrefa da trupe que engendram relatórios e castigos a seu bel-prazer e o “amordaçam” à letra e ao espírito da lei, que lhe compete cumprir e aplicar!

Mas há já tantos anos de Saudade da minha Universidade, com tanto Mestre que da Lei da Morte se Libertou!





4. Como bem deve saber, Dr. Ricardo Costa, tudo quanto é juiz e julgador julga-se um santo, imune a críticas que são consideradas um sacrilégio se dirigidas às suas santíficas missões pessoais. Deve saber, por exemplo, que os juízes estão constantemente a fazer queixinhas à Ordem dos Advogados contra estes. E a sua actuação não é em lugar restrito, em segredo, é pública, à vista e ao ouvido de toda a gente.
Os árbitro, também eles uns juízes julgadores, a maioria deles sem preparação alguma para a função de julgar, cometem asneiras atrás de asneiras, à vista de toda a gente. Para eles, arranjaram uma cobertura providencial na frase do errare humanum est que lhes desculpa toda a série de dislates. Julgam-se mais do que santos, julgam-se uns deuses de pacotilha. No fim, garatujam à sorte uma espécie de letras – a maioria nem sequer sabe ler e escrever – num papel a que dão o nome pomposo de “relatório” Aí podem escrevinhar as maiores barbaridades, as mentiras mais deslavas! Tudo em segredo, nada às claras!
E o que dizem é sagrado! Mais sagrado do que a bênção do Papa, o verdadeiro!

Agora dizem que Rui Costa foi punido pela Comissão Disciplinar por ter supostamente afirmado:

«Vocês não falam com as pessoas porque não têm carácter. Tenham vergonha das asneiras que fazem, tenham vergonha»

Isto foi o que a arbitragem escreveu no tal “relatório” do árbitro, a (quase sempre má) peça mais sagrada e santificada em Portugal do que a Custódia de Cristo!





5. Sei perfeitamente que a sua Comissão Disciplinar está amordaçada a esse relicário que, para o Regulamento Disciplinar, é sempre mais verídico e autêntico que dito do Papa, o verdadeiro. Mas compete-lhe, pelo menos, fazer a interpretação do texto e tirar daí as devidas ilações, porque aquele Regulamento Disciplinar não lhe proíbe a interpretação, nem podia proibir, impõe-lha sob pena de transformar o julgador num mero autómato cuja missão seria apenas a de ocupar, fisicamente, o lugar.

Por hipótese académica – que V.Exª, sendo Professor, tanto gosta de colocar na sua cátedra lectiva – vamos supor que as frases foram efectivamente ditas por Rui Costa.
Uma das premissas da interpretação, como V. Exª bem deve saber, é a do contexto e circunstâncias em que elas foram expressas.
Conhece esse contexto e essas circunstâncias? Sabe, por acaso, as maroteiras e os erros de palmatória sistemáticos e reiterados – esta sistematização e reiteração de erros sempre contra um dos contendores não lhe sugere nada? – com penalties inventados, pontapés de baliza transformados em pontapés de canto, tudo a favor do adversário do Benfica? Preocupou-se apenas um pouquinho acerca do porquê – a que V. Exª, como todos os julgadores, chamam de motivo – da hipotética reacção de Rui Costa?

E agora o outro lado da questão, o lado da interpretação do sentido das palavras supostamente pronunciadas. Acha V. Exª – que até já condenou e puniu a corrupção desportiva – que tais frases, no contexto e circunstâncias em que foram pronunciadas, “lesaram a honra e a reputação” de uma arbitragem daquele jaez?
Acha mesmo que tem carácter um árbitro que, depois do que andou a fazer durante um jogo todo, não devia ter vergonha das asneiras que praticou e que são apanágio da sua actuação quando arbitra um jogo do Benfica?
Considera que um árbitro, que até escolhe, ilicitamente também sob o ponto de vista disciplinar, observadores do seu agrado e a jeito para o favorecerem na sua classificação, tem algum carácter? Um árbitro que precisa de uma boa cobertura observatória não será porque quer ver branqueada a sua actuação encomendada e falseada!
Um árbitro desta espécie tem carácter, Dr. Ricardo Costa?





6. Pune-se Rui Costa, um homem exemplar, ele, sim, de carácter bem patenteado e demonstrado ao longo de toda a sua impoluta carreira desportiva, por causa de um arrazoado vingativo de um árbitro sem carácter! E considera-se este o verdadeiro, o deus da veracidade, enquanto aquele é o sacrílego da maldade que, em qualquer caso, apenas supostamente disse a mais cristalina e genuína verdade.

De facto, Dr. Ricardo Costa, fez-se o 25 de Abril para restaurar ou implantar a democracia, o livre pensamento, a liberdade!
Isto na vida civil porque, nos meandros do futebol, foi o mais apropriado e ambicionado pretexto para se reforçar o 24 de Abril a favor dos assaltantes do poder futebolístico, que nele implantaram a corrupção mais refinada que só V. Exª condenou, conquanto, no cerne da mesma, quase com uma pena do “faz de conta”! E sem consequências, nada!
Serviu apenas para reunir de novo o coro dos comparsas, em mais uma beata canonização do patriarca!
Por isso, essa corrupção continua bem activa, coadjuvada, branqueada e abençoada por altos comandos da política e – é V. Exª que o denuncia – pelo seu estranho e timorato arrependimento.

Uma das piores sujeiras que fizeram a este pobre futebol foi tornar a corrupção desportiva, a batotice mais refinada, numa coisa absolutamente banal. Basta ver a canonização que fizeram do papa, o jurador condenado por V. Exª, no dia do 27º aniversário da sua entronização.
Nem Nuno Álvares Pereira foi tão incensado com tão magnificente excelsitude!
E isso, Dr. Ricardo Costa, foi mais uma vitória do clube e do presidente que V. Exª condenou por corrupção desportiva na forma tentada. E são principalmente os julgadores deste país os principais responsáveis, mesmo culpados, por tornar o crime da batotice desportiva uma mera banalidade do nosso quotidiano. A eles se deve a reinstalação epidémica da sensação degradante de todos os valores e, particularmente, os de um dito Estado de Direito, que ganha impulso irreversível, no meio futebolístico nacional, com a velha e ressuscitada frase, afinal, “o crime compensa” …

E já não pega a estafada e malfadada cantilena da falta de leis. Leis há muitas, até demasiadas! A culpa é de que as não sabe aplicar!





7. O digno Rui Costa – o Administrador do Benfica, não o indigno do apito – é punido por dizer a verdade e por lutar contra aquela podridão. Ele, um honrado cavalheiro incapaz de maltratar alguém, nem sequer o maltrapilho do outro Costa sem carácter, de lição bem estudada e cérebro branqueado, vazio e insignificante.

Dr. Ricardo Costa, o digno Rui Costa não pode prestar sequer declarações públicas. Porém, Pinto da Costa, condenado por tentativa de batotice desportiva, já pode regurgitar o arroto da sua costumada e azeda farrampa! E dizem que a Comissão Disciplinar presidida por V. Exª o condenou!
Pode, então, o mui íntegro e honesto Rui Costa tentar corromper um árbitro para que essa tal Comissão Disciplinar lhe permita falar?

Esteja V. Exª bem descansado que, do Rui Costa que injustamente condenou, nunca tal sandice lhe perturbará a consciência!

O que sabemos é que isto é a pura lei da treta! Quanto mais justificações tentam arranjar para justificar o injustificável, mas se comprometem e desacreditam. Por uma vez, tenham a coragem – ou o carácter, como supostamente disse Rui Costa – de se assumir e digam a verdade!
A vossa lei não é cega, tem é dois pesos e duas medidas!
Uma, para aplicar aos corruptos e seus satélites, de resto, umas das faces mais visíveis da corrupção desportiva!
Outra, a mais pesada, não a que julga mas a que efectivamente pune, para aplicar ao Benfica!

Os que ofendem, choram, vociferam, fazem manguitos, chamam nomes às mães dos árbitros, dão cabeçadas e peitadas, arremessam medalhas, encontram árbitros distraídos e analfabetos que nem escrever sabem!
Mas, para V. Exª, Dr. Ricardo Costa, tais ignaros da escrita, da ética desportiva e do carácter, conseguem “observar” … e “avaliar” … e só não divinizam porque ficam envergonhados, não de si próprios e da sua covarde actuação – desconhecem o que isso significa – mas da multidão que os acanha!
E, se nem disso são capazes, têm sempre alguém que, telepata e presuntuoso, observa e avalia em seu lugar e em proveito de quem querem perdoar!
Porque, Dr. Ricardo Costa, só vêm para a televisão pedir perdão os que, contra sua razão e encomendação, cometem o sacrilégio de beneficiar, por pura distracção, o Benfica.
De onde lhes vem e por que terão eles tanto temor que, nessa sua pública, desusada e unicolorada confissão, nem dizem coisa com coisa?