É que eu subscreve, tim-tim por tim-tim, cada palavra, cada letra, cada vírgula, cada ponto final.
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25 Março 2009 - 09h00
Cozido à portuguesa
O melodrama do leão
Há cerca de mês e meio, durante um jantar em casa de amigos, dava na televisão o Belenenses-Sporting. Quando os leões marcaram os seus dois golos, um dos sportinguistas levantou-se, e gritou-me: "Tomem lá, seus chul..!"
Em vez de ficar contente, atacou o meu benfiquismo com insultos. Na altura, limitei-me a rir, pois só me incomoda quem pode, e não quem quer. Mas agora sei que se tratou de uma premonição do doentio desequilíbrio emocional que se vive este ano em Alvalade.
Como de costume, os sinais estavam lá. Vários jogadores insatisfeitos – Moutinho, Vukcevic, Veloso, Djaló – queriam sair do clube! Por sua vez os adeptos não queriam entrar, faltando aos jogos! Apesar dos bons resultados – vitória na Supertaça, boa campanha na Liga dos Campeões, luta pelo título – o mal-estar geral era notório, ao ponto de inesperadamente Soares Franco ter dito que não se recandidatava e o treinador ter anunciado a sua saída. Misteriosamente enjoada, a instituição perdia o rumo.
A humilhação dolorosa contra o Bayern, por 12-1, elevou o desequilíbrio interno a um pico febril, incluindo ameaças de morte a jogadores. Mas a infecção, carregada de pus, só rebentou finalmente na final da Taça da Liga. Sentindo o erro do árbitro como um "crime injusto", o lado irracional do leão explodiu como um vulcão. Viu-se de tudo: um jogador agrediu o árbitro e atirou a medalha fora; o treinador e vários jogadores proclamaram o crime de "roubo"; e o presidente Soares Franco, na televisão, assassinou o carácter do árbitro e, num piparote autoritário, decretou-lhe o fim da carreira.
Num golpe digno de novela mexicana, as vítimas tornavam-se agressores, exibindo um descontrolo emocional incompreensível. Com o pretexto de um erro, infelizmente banal no nosso futebol, cavalgaram "a teoria da vítima", justificando com ela actos gravíssimos e antidesportivos.
A "podridão", de que se queixa Paulo Bento, dá pois muito jeito. O clube exorcizou os seus demónios e uniu-se à volta do presidente, que até já admite recandidatar-se. Happy ending? Sim, mas só se esquecermos um delicioso pormenor, que ontem se descobriu: o golo do Sporting é precedido de uma falta sportinguista. E esta, hem? Chamem Freud e Jung, por favor! Neste melodrama irracional, o que parece fazer falta ao Sporting é um psiquiatra, que todos ouça e a todos receite calmantes.
Domingos Amaral, Director da ‘GQ’