segunda-feira, setembro 15

O ORÁCULO DO “CELSE”

com
Mestre "Celse" & Giorgio di Bufa
A religiosidade farisaica, o paganismo provinciano e a boçalidade trauliteira são, para além de três das suas imagens de marca, um dos triplos “cokctails” preferidos de Giorgio di Bufa.
Peregrinações à santa e bênçãos papais, consultas aos oráculos e feitiços de bruxos e charlatães importados da terra da macumba e do candomblé, complementados com as violentas cargas de porrada nas concubinas e nas amásias, reflectem o perfil de um ordinário patego de sacristia que nunca se cansou de empunhar falsas bandeiras e de usar a sua verborreia viperina, para fazer prevalecer o seu incorrigível miserabilismo parolo.
Eram e continuam a ser, realmente, três condimentos imprescindíveis no dia-a-dia daquele que trapaceiramente regressa ao futuro com muita antecedência.

Nesse dia, Giorgio tinha-se levantado tardiamente. A “soirée” nas “Noches Calientes”, até alta madrugada, bem regada de “Nuê & Xanton” com castanha caju salgada e picante para entreter, na presença de uma companhia muito especial, tinham sido a causa de um resto de noite tumultuoso, causando grandes transtornos às suas “miudezas”, já de si transtornadas, obrigando-o a contínuos exercícios de “elasticidade esfincteriana” com o seu dito cujo, através de “torpedos” e de “rasgadores” muito tóxicos que o deixaram completamente “zonzo” e de rastos, pela manhãzinha!
Abriu a janela do seu quarto, deixando escapar o metano aí concentrado, respirou um pouco daquele ar puro e fresco da manhã, trauteou uns acordes de “O Sole Mio”, recordando os bons velhos tempos do seu poder total e discricionário sobre “Palermo”, olhou-se depois ao espelho, perguntando para si próprio:
- O futuro do FCBatota está garantido. E o meu?
Giorgio pressentia que algo estava para acontecer.
Nos alvores de uma nova paixão, pensava e repensava naquela escultural, espantosa e sedutora mulher, que tinha conhecido através do seu braço direito nas “alternâncias da noite”. Estava a dar-lhe a volta à cabeça. Ele sentia isso e mais, com a quantidade de “cavalheiros da nota” e de “rufiões da noite” a cobiçá-la, ela não hesitou em lhe dar a primazia, presenteando-o com mil atenções, enleando-o com o seu charme e com a sua “química” poderosa.
– Sim, a parte final da noite, foi dedicada a si, caro presidente. Foi um prazer! – disse-lhe ela quase em segredo, num sotaque tão quente e com uma efervescência tal, que até o “champanhe” dos “flutes” começou a fumegar!
Ela era a mulher fatal, a mulher que viria a ser protagonista do início do declínio de Giorgio di Bufa. Chamava-se Carol “A Salgadona”.
Carol demonstrou na prática porque era ela a número um das “Noches Calientes”, a escolha preferencial daquela ávida e sequiosa “matilha” nocturna, de dentuça afiada, que gulosamente a filava, à espera de uma “chance” de ouro naquele antro da “noite” boémia, recheado com um “naipe” único de belas mulheres.
Mas, como diz o ditado, - “Guardado está o bocado, para quem o há-de comer”.
Foi sempre assim.
Giorgio, pelo sim, pelo não, procedeu de acordo com aquilo que era prática sua, há muitos anos – consultar o Oráculo.

Giorgio telefonou a marcar consulta, à qual foi dada prioridade absoluta.
Início da tarde, e lá estava Giorgio a chegar ao local, após uma curta viagem até Vilar do Visconde.
À porta, à sua espera, sorridente, estava o medium “Celse”, mais conhecido pelo “Efectivamente”.
“Celse” tinha a alcunha, em “Bacelos”, terra do galo, de “Tonalta”, pois dizia ele, na época das viagens dos astronautas ao nosso satélite natural, que “Os Tonaltas tinham chegado à Lua”. Após um percurso sinuoso e obscuro, apareceu intitulado de vidente com poderes mediúnicos, sendo mediatizado através de um ridículo programa emitido pela TV, no “Palermo” Canal, por meia dúzia de profissionais “rascas” que se entretiveram e entretêm agarotadamente e durante largo tempo, a fazer estas tristes figuras.
Boçalidade, ignorância e analfabetismo eram atributos demasiadamente benevolentes para quem com uma lábia do “arco-da-velha” e um expediente próprio de um charlatão de alto coturno, conseguia convencer os incautos que caíam no seu exótico “consultório”, mesmo aqueles com níveis de conhecimentos superiores, como era o caso de Giorgio di Bufa.
Das melhores, foi, aquando de uma entrevista em que lhe solicitaram as previsões do ano para o país quanto ao clima, ele, rabiscando à toa um bloco que tinha à sua frente, sem se deter, disse, com ar muito sério:
- Vai ser “climas” com muito, à volta de quarenta, quarenta e dois graus “científicos”, vai ser muito calor...vamos ter muito, muito frio em Novembro, vamos ter muito frio nas “ordes” de três a quatro por cento...no Alentejo e no Algarve as nossas “encostas” marítimas vão efectivamente ficar com uns centímetros a menos de terra.
Absolutamente brilhante!

No consultório, o forte odor a incenso, a grande bola de vidro comprada em saldo na Mariña Grã, fazendo as vezes da de puro cristal usada “nestas coisas”, colocada em cima de uma pequena mesa redonda, coberta com uma manta escura e mais uns quantos adereços dos mais diversos recantos do mundo, comprados em “segunda mão” na feira da Bandoma, em “Palermo”, e em lojecas de artesanato em “Coito de Perdigotos”, completavam um cenário de penumbra, envolto por fino cortinado de tom azulado escuro ao longo das paredes, com uns “leds” das iluminações natalícias no tecto, também escuro, a imitarem o firmamento, e com uma aparelhagem contrafeita a emitir como som de fundo umas notas musicais avulsas de piano, misturadas com o marulhar das ondas.
Já com ambos sentados frente a frente, “Celse” colocou o seu turbante preto com um “broche” em latão ao cimo da testa, cuja pedra azul clara, mesmo sintética, irradiava um brilho hipnótico, baixou os olhos, ergueu as mãos ao alto fazendo duas “raviangas”, lançou o grito do “ipiranga” e já está!
A consulta ia começar.
Concentração máxima com momentos de prolongado silêncio!
“Celse”, ó “Celse”, diz-me lá o que estás a ver... – dizia baixinho Giorgio.
Por enquanto nada, padrinho, por enquanto nada! – murmurava “Celse” preocupado, ao mesmo tempo que contornava a bola com as mãos.
Então, “Celse”, estás a ver “navios”, ou quê?
- Ó padrinho, já estou mas é a ver-te a “navegar” de joelhos, a fazer juras de amor eterno a um “naco” de mulher, que até eu me ajoelhava também! Vejo-a agora “entalada” entre super-matulões, a gritar com uma “toalha” na mão, no meio do inferno…- sussurrava “Celse”.
- Ó “Celse”, “entalada”? No meio de quantos? E no inferno? Será que estás a ver bem? Vê lá o que estás a ver, carago! – perguntava e avisava Giorgio, preocupado.
- Tranquilo! Tranquilo que não é nada do que estás para aí a pensar, ó padrinho! Ela está bem, está inteirinha. Está descansado que ninguém a come! Ela está mas é protegida! – ria-se maliciosamente o alarve do “Celse”.
Olha, olha, estou a distinguir a mulher a assinar uns papéis com um “gajo” superbarbudo ao lado e completamente vestido de vermelho. Será o teu novo casamento? – perguntava “Celse” admirado.
Ela é a mesma das primeiras cenas? – perguntava Giorgio, curioso.
“Celse”, a julgar que estava a dar alguma boa-nova a Giorgio, exclamou todo satisfeito:
- É, é, padrinho!!!
- Ó “Celse”, já estás a ver cores e coisas a mais, põe-te mas é concentrado e deixa-te dessas “merdas”, ok? – disparou Giorgio, com o sobrolho carregado.
- Padrinho, sabes que eu não te minto. Até vejo um santuário galego e tu a tirares-lhe umas fotografias numa fonte, com uma máquina descartável, antes de lhe tirares o pijaminha…Ai, ai, ai, ai, ai! Olha, olha ela, como o criador a deitou ao mundo, aaaaiiiiiiiii!, que nem quero ver mais, se não dá-me já um fanico!...Ó padrinho, tu é que estás um bocado murcho, carago! - dizia “Celse” todo atrapalhado, quase em transe.
- Ó “Celse” tapa lá isso, carago! Se não, ainda ficas mais à toa do que eu com as tuas vidências e previsões! – avisava com algum azedume Giorgio.
E continuava:
- Então eu venho para aqui tratar do meu futuro, e tu tens o desplante de estar a espiolhar as minhas cenas e os meus recantos íntimos?
Estás aqui a relatar algum filme de “hard-core”, ou quê?
Desconfio que por este andar, vais mas é fazer companhia ao Iulio Vás, sexólogo “mouro” da televisão da Trypalândia, ai “vás”, vais!
Anda lá, põe-te fino e desbobina o que me interessa, tá? – dizia Giorgio já impaciente.
- Tá bem, padrinho, tá bem, mas umas cápsulas de “Pilagra” não te fariam nada mal… – reforçava o “Celse”, com um sorrisinho malandreco, tacteando ainda a bola de vidro, como quem afaga o pêlo a uma boa lontra.
- Que estás a dizer e a fazer “Celse”? Vê lá, vê lá! Já te estás a “atirar para fora de pé” outra vez! – dizia Giorgio com uma voz zangada.
“Celse”, bruscamente desfez o gesto e agora um pouco mais calmo, depois da visão daquela cena tão quente e sensual que lhe tinha “esturricado os neurónios”, envolveu novamente a bola nas suas mãos, concentrou-se por uns momentos e começou com uma narração “dantesca”:
- D. Giorgio, depois desta cena vejo tudo muito nebuloso e um a...a…a…anão a sair do nevoeiro! Annnããããããããããooooo!
Ai! Ai, um anão, carago! Ai que azar do “camandro”! Tenho que o bloquear! Ah! Anão de uma figa que já me fugiste! Ai que “puta” de bola esta que já não o vejo! Querem ver que “o gajo” se meteu por debaixo da mesa? Ai que tragédia! – berrava ele, erguendo a bola e espreitando-a por baixo, ao mesmo tempo que abanava e levantava a manta.
Pousou novamente a bola, e aflito, lá continuou a debitar as suas “visões”:
- Olha, olha, agora é um cão a saltar para dentro de uma taça grande, um papagaio a ser cozido dentro de uma panela de pressão e os teus guarda-costas e o teu “chófer” a malharem na dita mulher e numa outra, perto, mas igualzinha, contigo presente, com uma outra ainda, já tua bem conhecida, atrás das sebes a gritar: - “Malhem nessa lambisgóia, nessa sanguessuga, nessa “alternadeira” do Canidelo! Arreiem-lhe sem dó nem piedade, que eu ainda hei-de ocupar o trono outra vez! Ai, hei-de, hei-de! Nem que tenha de me “recauchutar” todinha, carago!”
Agora está a aparecer a fulana que levou porrada, com um livro na mão a nadar numa piscina cheia de euros, talvez quinhentos mil, a dizer:- “Chau, chau, Giorgio, chau, chau!”
Instantaneamente, vi, neste momento, aparecer e desaparecer uma boa “brasuca”.
Depois, só estou a ver tribunais, advogados, juízes e tu “às aranhas”, acabrunhado, e eeee…eeee, numa festa, um general, ex-presidente, carrancudo, ao teu lado, a posar para uma fotografia para a posteridade, muito direito e com cara de pau, não sei bem a fazer mais o quê! – dizia “Celse” já completamente destrambelhado.
- Porra! Será que isto vai acabar assim? Nãããã, não pode ser! – abanava com a cabeça Giorgio, em sinal de desilusão.
“Celse”, acaba já com isso porque tu estás a perder qualidades! – levantou-se Giorgio furibundo.
Mas, padrinho…, padrinho, espera!
Giorgio arrancou a toda a velocidade e nesse dia nunca mais ninguém o viu!
Não é, que desta vez, o homem até tinha acertado?
“Yo no creo en las brujas, pero que las hay, las hay”!
Há coincidências do “arco-da-velha”!..E logo do “Celse”!!!.......
… O filme segue dentro de momentos!
GRÃO VASCO