A subjugação de Berto Mandril ao poder corrupto
com
Berto Mandril & Giorgio di Bufa
Em todo o gabinete da presidência a ansiedade e a tensão eram por demais evidentes.
O “staff” aguardava numa sala ao lado, num louco frenesim de roer as unhas!
A decisão da WEFA era uma incógnita e até a réplica grosseira e ridiculamente provinciana de uma taça perdida numa final, em “Brasileia”, na “Suissa”, para a “Velha Dama de Turim” de “Giovannelo Trapalhoni”, oferecida por um bando de papalvos, apresentava um brilho baço e acinzentado, tal o ar saturado que já se respirava.
Mais uma decisão desfavorável e seria o fim.
De certo que rolariam cabeças.
Giorgio, com o suor a correr-lhe em bica e uma respiração demasiado ofegante, bufando intermitentemente por todos os lados, batia com os dedos na mesa da sua secretária, esperando ansiosamente pelo toque salvador.
Aguardava a todo o momento a chamada de Berto Mandril, presidente do clube da Cruz das Caravelas.
Passados breves instantes que mais pareceram uma eternidade, eis que surge no visor do seu novo telemóvel (não fosse o diabo tecê-las) azul prata, com a figura de um mini-dragão na tampa e a imagem da santa na caixa da bateria, um número e as iniciais B.M.
O telemóvel tremeu pelo simultâneo toque vibratório, mas as mãos e as pernas de Giorgio também! Alapado na sua cadeira de executivo, estava lívido!
Tinha chegado a hora!
Giorgio, fixando-se na pequena imagem fluorescente da santa que tinha em frente a si, na sua secretária, fez mais uma tripla benzidela rápida, seguida de uma ladaínha abreviada aos santos padroeiros, e por fim, puxou e beijou, fervorosamente, a grande cruz em ouro cravejada de safiras e benzida, que a sua ex-querida e ex-primeira dama do seu clube lhe tinha comprado e oferecido em San Milagro de Comportela, e que trazia sempre ao pescoço pendurada por um cordão “pimba” de ouro de Gontomar. Após este ritual, o diálogo começou:
- Siiiiiiiiim? – pigarreou Giorgio titubeante, da mesma forma com que disfarça a estrefega das suas bufas “descidas à corda”.
- Táááá? Presidente? – pergunta Berto Mandril.
- És tu, Berto Mandril?
- Ó, ó presidente, quem é que havia de ser? – respondeu em jeito de pergunta, Mandril, soltando uma sonora gargalhada de descompressão.
E continuou:
- Então presidente, isso é que é sofrer, hã? Mas está tudo sob controlo. Pode começar a pensar como vai dar andamento a tantos milhões. Cá estarei à espera dos “carabineirozinhos” frescos e daquela lagosta suada, acompanhada de “D. Pérrichon”, que está prometida para o Pátio Sevilhano.
- Eh!Eh!Eh!Eh! Ó Mandril, tu como presidente executivo e eu como teu querido presidente, não demos hipóteses àqueles “sulistas vermelhos” e seus recentes aliados, os “fabricantes de faqueiros”. Eh!Eh!Eh!Eh! – ria-se e exclamava Giorgio feliz e aliviado, largando as primeiras “farpas” da tarde.
- Ó presidente, mas explique-me lá como é isso de presidente e eu também como presidente? – perguntava confuso, Mandril.
- Pois é, Mandril, eu sou o presidente dos presidentes! E tu? És ou não és presidente? – atirou-lhe manhosamente Giorgio, alçando o pernil e “esgalhando” agora, uma série ininterrupta de melodiosos “rasgadores”.
- Eu? Sou presidente, claro que sou! - respondeu “acagaçado” Berto Mandril, passando atabalhoadamente pela sua testa suada o seu lenço escuro com o monograma J.W. (“John Walk”) amarelo-dourado, ganho numa promoção que essa marca de “trotil” tinha feito nos Moscanteiros da Costa Velha.
- Mas, ó Mandril, tens a certeza de que está tudo sob controlo?
- Ó presidente, o puto já levou duas “nalgadas naquele rabiosque” depois da “deslealdade” que cometeu, e pelo que vi agora, encarrilou! Foi à WEFA fazer um bom número, pois as avaliações semestrais aproximam-se e há que acautelar o “pilim” e segurar a “cadeira”. Ele fê-lo bem, descartando-se ainda melhor no meio daqueles tubarões, que o que querem também é “rambóia”, “gajas” e dinheiro fresco. Uma mentirinha subreptícia e pronto! Ficou feito! Só o Pratini é que ainda estrebuchou. Com certeza ainda pensava que estava a espolinhar-se no relvado simulando alguma lesão… Toma que é para aprenderes! Quem manda não és tu, ó “françois”! Toma! Ah!Ah!Ah! – dizia todo entusiasmado Berto Mandril.
Olha Mandril, esse “mouro”que nem pense em cá vir! Que venha cá que eu ensino-lhe o que é a verdadeira batota! Apareça ele, que lhe mando um cicerone que eu cá sei, que vai direitinho para Cagaia, para umas caves que eu conheço, relaxar. Toma tamanha “carraspana” de vinho generoso “marado” que o mando pendurar no tabuleiro inferior da ponte D. Ruiz de cabeça para baixo a apanhar a geada do rio naquela tola, toda a noite…e se for com a corrente, ainda vai bater com ela no areal do cabedelo! - vociferava Giorgio, zangado.
Quem não gostou nada desta brincadeira foi o João Correeiro, mas é para ele saber como é que “elas mordem” e em “quantas caldeiras se faz uma saborosa e milionária caldeirada”! - reforçava Mandril.
- Assim é que é, Mandril, assim é que é! – gozava Giorgio, ainda sentado na cadeira, levantando e abrindo pela enésima vez as pernas, para “arriar” mais um “balázio” de elevados decibéis, da “bombarda flatulenta”.
Ah, Mandril! Tu com esta eficácia, depois de “teres mijado fora do penico” vais assegurar a continuidade…dos presidentes! – exclamava Giorgio, continuando insolentemente a descarregar metralha.
- Mas ó presidente? ...dos presidentes? – perguntou Mandril já completamente confuso.
Fez-se silêncio durante uns breves momentos.
Aflito e completamente baralhado despediu-se de Giorgio:
- Até logo presidente, até logo! Tenho o Tógonça Mascambilha em linha. – atirou em jeito de desculpa.
- Outro presidente? – perguntou Giorgio, curioso.
- Sim, sim, até logo! – despediu-se mais uma vez Berto Mandril.
Mandril pousou o telemóvel, passou a mão pela cara, franziu as sobrancelhas, cofiou aquela barba e bigode de rato, chamou a copeira da sede da agremiação e disse-lhe:
- Ó Zéza, traz-me um “John Walk”, rótulo preto, com duas pedras de gelo, por favor.
- Poooorra, do que eu me safei, ufff! – arengava Berto Mandril para as suas entranhas, suspirando.
E após um trago tranquilizante e ardente, espaçado pela inspiração de duas
profundas fumaças, pensativo, murmurou:
- Presidente? Mas que presid..?...Ora porra para isto! Presiden…é verdade! Mas o outro é que é o presidente e mais nada…e o resto é treta.
- Mas então quem sou eu? O que é que eu ando aqui a fazer? Presid…ora, ora…presiden…
…sim, o presidente é o outro, realmente!
Eu trato-o por presidente, e ele só me trata por Mandril e por tu!
Estou feito ao “bife”! Já nem com a da lagosta me safo!!!
GRÃO VASCO