quinta-feira, dezembro 31

O "crude" da Madalena

“Palermo” vivia dias de grande agitação.
Os “técnicos” responsáveis pelo abastecimento energético ao gueto desdobravam-se numa azáfama sem fim à vista.
As perfurações para se encontrarem novas jazidas sucediam-se a um ritmo alucinante. No calor da noite, ao lusco-fusco ou em plena luz do dia, na Ribeira, em Miracagaya, nas Fontezínhas ou na Sé, por baixo das pontes ou nas caves vinícolas do generoso, em Cagaya, todo o mundo corrupto escarafunchava para encontrar o cobiçado ouro negro. Até no leito do rio e nos esgotos da etar de Contumil.
Giorgio tinha estranhamente afirmado que as reservas se tinham esgotado. Mascambilhas e escândalos financeiros na Torre da Pocilga, negócios ruinosos de autênticos malabaristas, chorudos vencimentos da camarilha administradora, transfegas fumegantes para paraísos fiscais, comissões sobre vendas artificiais, conseguiram, não haja dúvida, cavar um poço sem fundo, um enigmático sorvedouro. Mas petróleo…nada!
No entanto, havia alguém que não estava mìnimamente preocupado com a situação. Era Juju Pepsodent.
- Para quê andarmos a gastar tempo em prospecções, se isto este ano é outra vez “trigo limpo”? Não, não vou precisar de reforçar o meu arsenal – arengava ele, taciturno, de beata ao canto da boca.
- Ora bem! Eh, eh, eh, é assim mesmo ó “mister”!– exclamou Giorgio, entrando de surpresa e de rompante pelo seu gabinete, fazendo tal estrondo que conseguiu abafar estratègicamente um potente balázio de metano das suas corruptas entranhas.
E não se contendo, continuou:
- Ó Juju, fica descansado, pois amanhã, dia 1, já estará pronto o primeiro barril deste novo lote de ano novo, e depois é só seguir viagem para o local mais conveniente. Como sabes, Lordêlo, Leiria, Madeira, ou mesmo a capital, são destinos importantes para esta mercadoria. E também temos de deixar ficar alguns aqui. O “crude” devidamente transformado na “refinaria” da Madalena, já virá prontinho a ser consumido. Só para tua informação, envelopes, presentinhos, “vauchers” de viagens ao Brasil, “eurinhos”, cafézinhos, cházinhos e chocolatinhos de primeira qualidade seguem já dentro da primeira remessa de barris. Fica descansado, Juju, está tudo controlado.
- Eh, eh, eh! Ó “boss”, afinal há mesmo combustível. O “crude” afinal é de boa qualidade. Os teus prosélitos é que são mesmo uma cambada de ceguetas, caramba. Andam tolinhos a escavar para o patrão, e tu a gozares o panorama – dizia Juju rindo-se com aquele ar azedo e cavernoso.
E em jeito de desabafo final disse-lhe:
- Só tenho aqui um problema, sabias?
- Mas que problema? – indagou Giorgio.
- Vaginildo! – respondeu secamente o “mister”.
E continuando:
- O rapaz em vez de “cavar” em profundidade, atira-se muito para o chão, levanta muita areia da erva, manda uns grandes balões para as laterais e tem uma claustrofobia em grau adiantado. É um bico-de-obra nos túneis. Se calhar o desmame não foi em condições. Mamou desabridamente, sem controlo, durante aqueles três anos, como os lambe-botas dos novelistas de “O Nojo” estùpidamente apregoam, e depois é o que se vê. Ou então foi da vacina “H1N0” que levou do enfermeiro Luiz, quando esteve lá em baixo na capital a aprender alguma coisinha. Fazia parte do protocolo levar a vacina, sabias?
Nisto, Giorgio, já com suores frios, inadvertidamente, largou mais um sonoro e fedorento rasgador, envolvendo-se numa nuvem densa e intragável.
Fez-se silêncio, Juju acendeu mais um cigarro diluidor, e passado momentos, em tom aflito, ouviu-se a voz de Giorgio:
- Ai, Jesus!!!

De agora em diante, tem a palavra o Messias. Nem de propósito. Aconteceu mesmo no Natal, em véspera de Ano Novo.

Bom Ano Novo para Vós, Companheiros, e para o Nosso e Querido Benfica!!!

GRÃO VASCO