"O árbitro foi Raul Ribeiro, de Aveiro. [Se bem me recordo, era na altura funcionário da Revigrés e foi mais tarde funcionário da Câmara Municipal de Aveiro.] Raul Ribeiro esteve tão mal que lhe atribuí a nota mínima: zero. Escrevi então: «O primeiro "penalty" não existiu, pela simples razão de que ninguém tocou em Futre. Os descontos foram perfeitamente exagerados. A desigualdade de critérios foi constante». [O primeiro "penalty", ainda antes do intervalo, foi desperdiçado por Gomes, que rematou ao lado. O FC Porto chegou à vitória com outro "penalty", marcado por André, já depois dos 90 minutos.]"
"Naquele tempo, os árbitros prestavam declarações aos jornalistas no final dos jogos. Foi o que fez Raul Ribeiro. E depois de afirmar que «não sou adepto do FC Porto, porque eu sou do Belenenses», disse que marcou o "penalty" decisivo quando «faltavam ainda três minutos para terminar o jogo, porque costumo parar o cronómetro quando há jogadores a receberem tratamento, substituições e outras paragens». Erro crasso, porque este comportamento não está, nem nunca esteve, previsto nas Leis do Futebol."
"Por isso, na quarta-feira seguinte, publiquei um texto intitulado "Raul Ribeiro e os seus cronómetros: um caso de má interpretação da lei". Explicava que a cronometragem de um jogo de futebol não é igual à de uma partida de basquetebol (em que o cronómetro pára sempre que a bola não está em jogo) e juntava até opiniões de um jornalista do "Diário Popular" («Os minutos dados a mais não tiveram a mínima justificação», Costa Santos) e de outro de "A Bola" («Prolongou o tempo de jogo para além do justificado», Joaquim Rita). E pensei que o assunto morreria por ali."
"Nesse dia, viajei para o Funchal para fazer a reportagem de um jogo da selecção B de Portugal. E foi de lá que liguei para a delegação de "O Jogo" em Coimbra, para saber se estava tudo a correr com normalidade. Diz-me o Fernando Madaíl: «Chegou uma carta do FC Porto para ti». Pedi-lhe que a abrisse e a lesse ao telefone. Ele assim fez. Eram duas folhas em papel timbrado, com o emblema do clube em relevo e a cores, uma carta violenta, a criticar duramente o tal texto sobre os cronómetros de Raul Ribeiro."
"O director de "O Jogo" decidiu não publicar a carta no jornal, impedindo-me assim de dar uma resposta pública. Mas respondi pessoalmente ao subscritor, Álvaro Braga Júnior, então funcionário do Departamento de Futebol do FC Porto. Lamento ainda não ter encontrado a carta, mas enviei-lhe (entre a carta propriamente dita e os "anexos") um envelope com mais de 15 ou 20 folhas.
O jornal do FC Porto viria a publicar a carta de Álvaro Braga Júnior no dia 5 de Março, ao alto da página 3, com o seguinte título em maiúsculas: «Já o conhecemos sr. Mário Martins».
[Até hoje (não sou parvo, mas...) ainda não percebi uma coisa: tendo eu escrito um texto sobre o árbitro Raul Ribeiro, porque é que foi o FC Porto a responder-me?]"
"Resta acrescentar que o texto azul-e-branco não desmente nada do que escrevi, limitando-se a criticar-me por alegados maus desempenhos aquando da passagem pela arbitragem do futebol, como auxiliar do juiz conimbricense Castro e Sousa. Mas até nesse aspecto o referido Álvaro Braga Júnior mete "a pata na poça": na época a que ele se refere, a equipa de arbitragem de que fazia parte, do 1.º escalão nacional, ficou classificada no 8.º lugar, entre 34 equipas. Nada mau.
[E isto levanta-me uma outra dúvida, nunca respondida até hoje: como é que o FC Porto tinha acesso aos relatórios dos delegados técnicos que avaliavam os árbitros?]"
Certamente que este testemunho não pode surpreender ninguém, mas é sempre bom constatarmos que 27 anos depois a estratégia se mantém, e que sem essa mesma estratégia o futebol corrupto do porto não consegue viver: ajudas de árbitros, intimidação a jornalistas e acesso à avaliação dos árbitros. Uma podridão sem fim, mas pelos vistos há quem goste...
PS.- com o contributo do leitor Qwerty, aqui ficam as imagens do jogo acima testemunhado: